“Caim e Abel - As Bestas”
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| Foto: Giego Bresani |
Com
dramaturgia potente e pesquisa cênica aprofundada, montagem multimídia do Grupo
Desvio estreia em outubro no Sesc GAMA
Dois homens atravessam um deserto
interior confrontando seus medos, vulnerabilidades e a violência que carregam.
Um cavalo questiona a humanidade e reelabora o monólogo de Hamlet. A Medusa
observa o espírito de homens de coração de pedra. Este é o universo de “Caim
e Abel - As Bestas”, novo espetáculo do Grupo Desvio que
parte do mito fundante de Caim e Abel para mergulhar nas raízes da violência
masculina. Com texto de Gil Roberto e direção de Rodrigo
Fischer, a peça estreia em sessões nos dias 9 e 10 de outubro, no Teatro
Paulo Gracindo (Sesc Gama).
A dramaturgia, sólida e bem
embasada, constrói uma cartografia da dominação, intercalando cenas de tensão
visceral com reflexões poéticas e provocações políticas. A narrativa questiona:
“O que é um homem, um certo tipo de homem? O que o homem quer?”. A peça evita
respostas fáceis, preferindo explorar as contradições e a impotência que
fundamentam esse poder violento.
O roteiro é alimentado por
referências literárias e filosóficas densas, como Dostoiévski, Roberto Bolaño,
Bell Hooks e Nietzsche, tecendo um discurso urgente sobre masculinidades
tóxicas e seus desdobramentos na sociedade contemporânea. Com trilha sonora
executada ao vivo, a obra traz ainda cenas de humor ácido amplificando críticas
à masculinidade tóxica.
Sobre o processo de construção
A criação de “Caim e Abel As
Bestas” é fruto de uma longa pesquisa do Grupo Desvio, que desde 2001 investiga
a linguagem cênica e, desde 2008, incorpora novas tecnologias e poéticas
audiovisuais. O processo começou em outubro de 2024, com encontros semanais
entre o diretor e o dramaturgo para estudos e discussões conceituais.
Em março de 2025, a equipe
principal – incluindo o ator Márcio Minervino e o
cineasta Bruno Zakarewics – realizou uma imersão de 10 dias em
Cavalcanti (GO). O objetivo foi triplo: confrontar pessoalmente a pergunta “O
que é ser homem?”; iniciar improvisações a partir de um canovaccio
(roteiro-base); e realizar experimentos fílmicos em paisagens reais, cujos
registros serão integrados à cena e a um documentário. O método foi de
“escavar” incessantemente, buscando um “impulso descondicionado” para repensar
noções de masculinidade no corpo e na performance, tratando a realidade, o
sonho e a ficção como matéria prima para a criação.
Questões políticas urgentes e
a desconstrução de uma certa masculinidade
“Caim e Abel - As Bestas”
posiciona-se explicitamente como um projeto político. A peça aborda a relação
entre a violência e uma masculinidade patriarcal que decide “quem deve matar e
quem deve morrer”, citando dados do Atlas da Violência (FBSP/IPEA) que
evidenciam o homem como principal agente e vítima dessa violência, com impactos
devastadores sobre jovens, populações negra e indígena, mulheres e LGBTQIAPN+.
O espetáculo busca desconstruir
os pilares dessa masculinidade nociva, identificando-a como operacionalização
de um ideal patriarcal que se manifesta no controle dos corpos, na distribuição
desigual de poder e riqueza, na divisão sexual do trabalho e na violência
estrutural. A crise, como aponta a filósofa Bell Hooks (uma das referências do
projeto), não é da masculinidade, mas da masculinidade patriarcal.
A montagem evita dualismos e permite que a contradição habite a cena, propondo
a reflexão sobre a possibilidade de esses homens reencontrarem seu feminino
genuíno e sua “criança selvagem” para cantar “uma canção carregada de cuidado e
flor”.
A peça ecoa a reflexão crucial
que orientou sua criação: "o grande problema do poder não está em sua
potência, mas sim em sua impotência e é esta impotência que torna o poder tão
perigoso. A potência afirma a vida e a impotência reage a ela. A impotência é
ressentida". É esse ressentimento, argumenta o projeto, que conecta
diretamente a violência masculina a expressões como autoritarismo, fascismo e
nazismo, "ao poder de um determinado tipo de homem, sobre um conjunto de
diferenças que colocam em xeque a imagem e semelhança desses homens".
Histórico do Grupo Desvio
Com 23 anos de trajetória, o Grupo Desvio é um dos coletivos artísticos mais consolidados de Brasília. Sob a direção de Rodrigo Fischer, o grupo é conhecido por investigar o processo criativo do ator e, posteriormente, por incorporar linguagens multimídia e interdisciplinares, criando obras para teatros, galerias, museus e cinema. Com nove espetáculos no repertório, o grupo já se apresentou em oito países (França, EUA, Espanha, Alemanha, Geórgia, Bielorrússia, Estônia e Tunísia) e foi contemplado por editais de instituições como Caixa Cultural, Petrobras Cultural, Funarte e Secretaria de Cultura do DF.
Serviço:
Espetáculo “Caim e Abel - As
Bestas” – Grupo Desvio
Local: Teatro Paulo Gracindo –
SESC GAMA (Setor Leste, Gama – DF)
Datas e Horários:
Dia 9/10 (quinta-feira) – 15h
(sessão com intérprete de Libras)
Dia 10/10 (sexta-feira) – 19h
(sessão com audiodescrição)
Classificação Indicativa: 16
anos
Duração: 120 minutos
Entrada: gratuita (sujeita à
lotação do espaço)
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